Costumamos dizer que todo projeto pressupõe conhecer bem o cliente e que o arquiteto, mais que um parceiro, é um cúmplice.

Esse cliente nos foi apresentado por um amigo comum e, logo no primeiro encontro já foi dizendo que, embora tivesse comprado seu terreno em um condomínio de Itatiba, SP, queria morar num casarão de fazenda do século XIX.

Aceitamos o desafio e decidimos desenvolver o projeto usando a técnica construtiva dos casarões dessa época: o pau a pique.

Nossa inspiração para o projeto

Nos inspiramos em uma sede de fazenda, construída em 1855, que estava para ser demolida, na divisa de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Fomos até lá pra verificar o que poderia ser aproveitado e fazer um levantamento detalhado com fotos e desenhos.

A sede da fazenda era simples, com poucos adornos. Estava bastante deteriorada, telhado muito estragado, grande parte dos forros e assoalhos apodrecidos pela água das chuvas. Mas ainda assim era bonita e tinha uma dignidade própria das casas da época.

O projeto contemplou além do casarão, uma casa de caseiro e uma área de lazer com piscina, totalizando 730 m² de área construída.

Todas as janelas e portas da sede da fazenda foram aproveitadas, parte das telhas de barro moldadas na coxa dos escravos, escada e patamar em pedra, cobertura de ferro da escada, guarda-corpo e corrimãos, parte dos forros e assoalhos.

Partimos do conceito arquitetônico e tipologia dos casarões do século XIX e fizemos as modificações e adaptações necessárias aos dias de hoje e aos hábitos do nosso cliente.

Numerosas peças foram restauradas

Para restaurar as peças antigas de madeira, confeccionar novas com madeira de demolição, montamos uma marcenaria na obra. Produzimos um número incontável de molduras de forro, adornos de janelas e portas, milhares de treliças e muita restauração de peças originais danificadas pelo tempo.

Além do material trazido da sede da fazenda, o projeto e a obra contaram com vários aspectos de sustentabilidade:

  • o resgate da técnica do pau a pique, usando terra dos arredores da construção;
  • a opção pelo sistema pré-fabricado de tratamento de esgoto doméstico, com reaproveitamento da água para irrigação de jardins e limpeza externa da casa;
  • o uso de madeira de demolição em 80% da obra;
  • o uso de telhas de barro de demolição em todos os telhados;
  • a opção pelo sistema de aquecimento solar na casa principal e do caseiro;
  • o uso das sobras (refugo) de madeira da marcenaria no fogão de lenha, para aquecer as marmitas dos trabalhadores da obra.

Usamos a casa do caseiro como laboratório para aprender a técnica do pau a pique e, com a equipe treinada, começamos a construção do casarão. Lidar com o barro transformava todo o canteiro de obra numa festa.

A cor de terra das paredes, que nos acompanhou por meses e dava uma luminosidade acolhedora a toda casa, aos poucos foi sumindo e dando lugar ao branco dos casarões de fazenda.

Quando já não havia quase rastro do processo de construção, decidimos deixar a parede da escada sem terminar e sem pintar.

Ficou linda e é a única que poderá contar essa história aos que vierem depois de nós.

 

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